A arte do Realismo na Micropigmentação: talento ou prática?

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Artigo retirado do livro do 4º Congresso Científico Internacional de Micropigmentação. P. 380-386.

O trabalho intenso supera o talento quando o talento não trabalha de forma intensa.

Talento, dom, capacidade, aptidão, vocação, chamado… sempre que observamos alguém executando com maestria, beleza e excelência alguma tarefa, a isso buscamos dar um nome que justifique tal genialidade. Assim, buscamos de certa forma entender o porquê alguns fazem de forma tão bela e outros sequer conseguem dar os primeiros passos.

Desde 1994, venho desenvolvendo a arte do desenho realista feito a lápis e estudando suas variadas técnicas. No ano de 2003, comecei a compartilhar meu conhecimento com outros que também traziam o interesse em aprender. Percebi então o “mito” que pairava sobre as pessoas em relação à possibilidade de aprender o desenho como uma “técnica”.

As pessoas me procuravam e me perguntavam: é possível aprender a desenhar assim ou tem que ter algum “dom”?

Eu estranhava e não sabia responder ao certo a essa pergunta pois, ao olhar para trás e observar minha trajetória de aprendizado, se eu respondesse que desenhar com tal qualidade era resultado de um determinado “dom” eu estaria negando todo o trabalho intenso que eu havia dedicado para desenvolver e alcançar tais resultados.

Por outro lado, eu tinha o receio de dizer que aquilo que eu fazia era fruto somente de meu esforço, pois isso me soava arrogante. Nesse sentido, cresci ouvindo que desenhava bem porque “Deus tinha me dado o dom de desenhar”.

Confesso que não sabia exatamente o que responder e tentava assim explicar o processo que eu vinha desenvolvendo para chegar a tais resultados em meus desenhos.

Minha explicação era de que o chamado “dom” consistia na paixão que eu tinha em desenvolver e compreender a arte de desenhar. Logo, essa paixão me conduzia incansavelmente pelo processo de busca por melhores resultados.

Ao aplicar os exercícios de desenho aos primeiros alunos, comecei a perceber que não era somente a prática de determinadas técnicas que os ajudava a desenhar melhor. Também, uma certa “forma de ver” que fazia uma grande diferença nos desenhos. Assim, os resultados mais expressivos começavam a aparecer quando então mudava-se essa “forma de ver”.

Costumo dizer que o artista é aquele que olha o que todos olham mas vê o que nem todos vêem.

Por isso, antes de entender onde a arte de desenhar se associa com a arte da micropigmentação, precisamos derrubar alguns mitos que corrompem nossa compreensão de arte e interrompem a busca pela excelência em qualquer atividade.

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O mito do artista

Quando ouvimos a palavra “artista”, imaginamos logo alguém que pinta quadros, esculpe, atua no teatro, canta nos palcos ou tem algo a ver com a notoriedade de suas atuações.

Devemos entender que artista é todo aquele que se expressa por meio de sua “arte”. Ou seja, arte é qualquer atividade humana que busca alguma forma de se comunicar ou se fazer conhecer. Assim podemos perceber a arte por meio de incontáveis formas de comunicação e linguagens.

Em outras palavras, a arte é o meio de se tornar palpável ou notório aquilo que se manifesta no campo das percepções e das emoções.

Sendo assim qualquer atividade que você se propor a fazer de forma que se busque a singularidade de seu olhar e a excelência na execução de tal atividade, você estará buscando sua expressão artística.

E isso poderíamos nos referir a qualquer tipo de atividade!

É normal ouvirmos: “Nossa!…Essa pessoa é uma artista no que faz!”
Essa expressão se refere à pessoa que realiza determinada atividade de um jeito único, ou seja, ela de fato se expressa por meio daquilo que faz e imprime sua identidade e seu singular modo de ver naquilo que faz!

Assim, qualquer atividade que uma pessoa realize de maneira que ela consiga se expressar de uma forma maravilhosa e única, ela estará se manifestando artisticamente.

O mito do dom

É inegável que há indivíduos cujas habilidades se mostraram notáveis desde cedo, são pessoas que têm uma tendência, uma certa dose de facilidade acompanhada de uma curiosidade por algo.

Eu acredito muito que o chamado dom repousa mais nessa curiosidade incansável do que propriamente na execução de determinada atividade!
Pois é essa tal curiosidade que move a busca e a perseverança na direção do aprendizado.

O grande problema é que classificamos o dom baseando-nos na excelência com que alguns indivíduos realizam determinada atividade. E assim nos esquecemos que tal excelência na execução é fruto de um árduo caminho de prática em busca de resultados cada vez mais expressivos e conscientes.

E pelos resultados muitas vezes classificamos tais pessoas como “gênios” por se destacarem da maioria. Mas essa ideia de “gênio” já carrega alguns pré-conceitos que não correspondem à realidade, pois o que caracteriza estes indivíduos é a paixão e a curiosidade por determinado assunto. São tomados de um desejo incansável de aprender tal atividade.

Vale lembrar que a jornada destes indivíduos que se destacam, não é motivada por fama, reconhecimento ou dinheiro, o desenvolvimento das habilidades destes tais gênios é normalmente acompanhado de um prazer intrínseco por fazerem algo que amam.

Assim, esse prazer não está na expectativa de serem reconhecidos pela conclusão da atividade. O prazer é pessoal, se dá no percurso, no processo, na busca pelo aperfeiçoamento da técnica.

Concluindo; o dom para exercer qualquer atividade repousa na curiosidade incansável em busca de técnicas que melhor expresse o aperfeiçoamento de sua percepção.

E assim essas técnicas nunca param de evoluir, pois a curiosidade e a prática apaixonada é o combustível que transforma uma mera atividade em uma verdadeira expressão artística!

A prática sem a compreensão da técnica é inútil

Uma das coisas que mais ouvimos é sobre a necessidade de praticar ou treinar para alcançar resultados.

Quando comecei a ministrar aulas presenciais de desenho, eu insistia na necessidade do aluno praticar. Depois de algum tempo, percebi que essa prática dava leveza e certa confiança ao aluno, no entanto o aspecto do trabalho era artificial e trazia erros que mesmo com a prática, não eram corrigidos. Pois estes mesmos erros eram frutos da falta de percepção e não necessariamente da falta de prática.

Em outras palavras, não adianta praticar sem entender. Não adianta praticar sem perceber onde estão os erros, pois dessa forma você poderá estar praticando de maneira errada. Literalmente, você terá prática em reproduzir os mesmos erros e não alcançará nenhuma evolução.

Desenho de Charles Laveso - Campanha contra estupro
Desenho de Charles Laveso – Campanha contra estupro

Quando se muda a forma de ver, muda-se a forma de fazer

Quando comecei a provocar os alunos a perceberem e se questionarem sobre o que estava errado em seus desenhos, eles mesmos começavam a buscar caminhos para corrigir estes mesmos erros. Ou seja, a prática começava a ser conduzida de forma consciente.

Partindo deste ponto de vista começamos a trabalhar mais a percepção, o olhar, o questionamento, o estudo de imagens, a prática de exercícios visando o aperfeiçoamento dos traços a cada etapa. Começamos a gerenciar o sentimento de ansiedade inerente ao processo de aprendizado, substituindo-o pelo prazer que se dá quando conferimos valor e atenção a cada estágio do fazer.

Os resultados começaram a aparecer nos trabalhos de alunos que jamais se imaginavam realizando obras com tal expressividade.

E isso me fortalecia a certeza de que eu estava no caminho certo.
Quando me perguntavam se era necessário ter “dom” para desenhar, eu já sabia o que responder pois os resultados dos alunos já falavam por si.

O Realismo na arte da micropigmentação

Como já foi dito anteriormente, consideramos arte a qualquer atividade que você se propõe a fazer em busca da singularidade de seu olhar e da excelência na execução de tal atividade.

Nesse caso, quero que analise o processo de micropigmentação, tendo como premissa a ótica de uma obra realizada por meio de uma expressão artística.

Pensemos na possibilidade de dividir nossas atividades em duas categorias, sendo como: Padronizada e Artística.

Mas antes vamos entender cada uma destas duas categorias.

Padronizada

É a categoria que busca atender um trabalho bem feito sem ter como foco a excelência do mesmo. Em outras palavras, são aqueles que obedecem a um padrão e nunca ousam expressar sua identidade ou sensibilidade artística na atividade que realizam.

Assim, buscam conceitos pré-estabelecidos ou receitas que deram certo por estar há mais tempo no mercado. Dessa forma, engessam qualquer possibilidade de inovação gritando com vozes de outros. Mas quem assim o faz, não grita, apenas ecoa.

Artística

É a forma de ver que acrescenta a diferença sobre o que foi estabelecido como padrão, é a voz de cada um que busca se expressar por meio de sua percepção de mundo. É a voz que questiona, que busca conhecimentos, que quebra paradigmas e que não se conforma com a ideia de que as coisas devem ser feitas sempre da mesma maneira.

É a forma de ver que não se satisfaz, que quer mais e vai em busca da excelência.

Assim, a arte do Realismo vem ao universo da Beleza e Estética para acrescentar este olhar artístico e fazer com que a micropigmentação seja mais do que uma profissão, mas que também reconheça o profissional por um olhar artístico que adorna, embeleza e promove a possibilidade de transformações pessoais.

A micropigmentação não é só uma profissão, mas indiscutivelmente uma arte!

Se você não nasceu sendo, com trabalho duro poderá se tornar.

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